Conservatória: amor cantado e declamado em serestas e serenatas

Guilherme Renso

Quem gosta de música antiga, levanta a mão! Eu, por exemplo, enquanto escrevo essa matéria, estou ouvindo Naquela Mesa, imortalizada na voz de Nelson Gonçalves. Mas, melhor que isso seria fazer a mala e ir direto para Conservatória, distrito de Valença, no Rio de Janeiro. Aí sim, estamos falando de uma imersão nesse universo, principalmente nas boas e inesquecíveis serestas e serenatas. Qual a diferença entre as duas? A primeira é realizada em ambiente fechado e, a segunda, vem a ser todo o romantismo do canto à noite, no sereno, pelas ruas. Daí, serenata.       

Falando sobre o início dessa fama que perdura até hoje, Roberto Velasque, que é seresteiro em Conservatória, conta que tudo começou a partir de 1878, em pleno ciclo do café. Naquele contexto, os barões levavam professores de música da corte para fazer saraus e entreter as famílias nobres. Depois desse momento, todos ficavam nas ruas, tocando violinos e, assim, atraiam a população local.



Na sequência dos fatos mais importante dessa cronologia, aparecem os irmãos José Borges (guarde esse nome) e o Joubert Cortines, que chegaram ao local em 1938 e, ainda jovens, se integraram ao movimento já existente. Mais tarde, na década de 1960, José e Joubert assumem a liderança da turma e começam a trazer para Conservatória a fama tal como ela é ainda hoje conhecida.

Nossa, mas o que eles fizeram de diferente? Muita coisa. A primeira delas foi tornar a seresta um hábito na cidade. Desse modo, todas as sextas e sábados, a partir das 23 horas, sempre há um ou mais seresteiro, do grupo de aproximadamente 40, entoando versos e acordes em serenatas que ganham as ruas. O ponto de partida, conforme Roberto nos contou, é em frente à estátua do José Borges, que carrega um violão e está na travessa professora Geralda Fonseca, ou Rua do Meio.

Ainda sobre os irmãos, foi também por conta deles que surgiu o projeto “Em Toda Casa Uma Canção”, que consistia em colocar, na fachada das residências, placas com nomes de músicas brasileiras e românticas. No ano do seu encerramento, em 2003, a iniciativa contava com 403 placas, sem repetir nenhuma. O nosso rei Roberto Carlos também era o rei das plaquinhas, seguido pelo poetinha camarada Vinícius de Moraes e por e Cândido das Neves, grande expoente do gênero.

Quem quiser sentir a romântica efervescência em datas festivas, aqui vão duas das oportunidades. A primeira ocorre no último sábado de maio, no Dia do Seresteiro. A outra será no último sábado de agosto e é lembrado como o Encontro de Seresteiros.

Mas, e durante o dia? Assim que o sol dá o ar da graça, ou até mesmo quando ele está com preguiça de aparecer, a sugestão é fazer alguns passeios de charrete e conhecer, por exemplo, a Igreja Matriz de Santo Antonio. Ou seja: quem quiser encontrar a metade da panela, digo, a tampa da laranja (vixi, confundi tudo) por lá, a hora de bater um papo com o padroeiro é essa. O prédio fica na Praça Getúlio Vargas.      

Depois de conversar com ele, corra lá pro Museu Vicente Celestino, onde encontrará diversos documentos históricos do cantor de serestas, falecido em 1968,  e da esposa, Gilda de Abreu, além de, entre um acervo e outro, ter a possibilidade de conhecer aquele broto, né? Agora, se Fernando de Bulhões já tiver feito a parte dele, também vale, claro. E não se esqueça de tirar vários retratos com o pão da sua vida, ou a donzela, e mandar pra gente. O endereço é Rua Pedro Gomes, nº 50.

Por fim, depois de conferir de perto todas essas atrações, hora de tomar aquele cafezinho maroto. Nesse caso, não será só o cafezinho, mas a fazenda de café inteira. Calma que eu explico. Lembra quando eu disse que Conservatória faz parte de Valença? Então. Valença, por sua vez, integra o chamado Vale do Café e, por tal fator histórico, preserva casarões daquela época. Mas é bom ligar antes e agendar a visita monitorada, combinado? Se quiser continuar no clima, não deixe se acessar a Rádio Sarau, clicando aqui: http://radiosarau.com.br/